SÃO PAULO – Dois dias após o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) anunciar desistência do programa Renda Brasil e ameaçar de “cartão vermelho” membros da equipe econômica que sugerissem congelamento do salário mínimo e aposentadorias ou corte de benefícios de idosos e deficientes para viabilizar recursos para um plano de renda mínima, o tema segue em discussão nos bastidores da política.
Ontem (16), o relator da PEC (Proposta de Emenda à Constituição) do Pacto Federativo e do Projeto de Lei Orçamentária Anual (PLOA) de 2021 no Congresso Nacional, o senador Márcio Bittar (MDB-AC), foi autorizado pelo presidente a retomar as discussões sobre um novo programa social para suceder o auxílio emergencial, prorrogado até dezembro com repasses de R$ 300.
No mesmo dia, Bittar teve um encontro com o ministro Paulo Guedes (Economia), para tratar de possíveis fontes de financiamento do novo programa. O parlamentar, no entanto, disse que não anteciparia informações sobre os caminhos estudados ou valores planejados.
A posição mais cautelosa foi adotada depois de duras críticas de Bolsonaro à ideia ventilada pela equipe econômica de não conceder reajuste aos benefícios previdenciários, como aposentadorias, pensões, auxílios-doença e salários-família, por dois anos – o que na prática culminaria em perda de poder de compra de parcelas vulneráveis da população, apesar de as expectativas de inflação baixa no período.
Desde o vídeo do presidente, analistas políticos têm monitorado o comportamento de três elementos no campo do risco fiscal. O primeiro seria o novo desgaste gerado em integrantes da equipe econômica pela ameaça de “cartão vermelho” um mês após uma “debandada” de quadros importantes da pasta.
A fala de Bolsonaro gerou especulações sobre a situação do secretário especial de Fazenda, Waldery Rodrigues. Foi ele que disse, em entrevista ao portal G1, que a equipe econômica estudava o congelamento por dois anos do reajuste de aposentados e pensionistas para assegurar recursos para o Renda Brasil. Segundo ele, também estava em avaliação a restrição do acesso ao seguro-desemprego.
Depois das duras críticas, Bolsonaro fez um gesto público em apoio ao comandante da equipe econômica. Durante a cerimônia de posse do ministro da Saúde, general Eduardo Pazuello, o presidente disse que Guedes “tomou uma série de medidas” para preservar empregos formais no país e parabenizou o ministro.
O segundo ponto monitorado seriam os rumos da discussão sobre o novo programa de renda mínima caso passe à margem da equipe econômica e se concentre no Congresso Nacional. Neste caso, a avaliação é de um cenário mais negativo para o cumprimento do teto de gastos no ano que vem.
“Há que se atentar na continuidade das negociações sobre o programa – que chame ou não Renda Brasil. A discussão com menos participação do time econômico reforça riscos de gastos excessivos que já eram sentidos antes”, observam os analistas políticos da XP Investimentos.
“Há também que ser lembrado que o senador Márcio Bittar tem grande proximidade com o ministro Paulo Guedes. Este é um dado positivo, obviamente. Mas não deve ser levado em conta além do recomendável”, ponderam.
Por fim, observa-se como a repercussão do vídeo do presidente pode esfriar o debate sobre revisão de despesas obrigatórias e rompimento do piso de gastos orçamentários.
O relator Márcio Bittar promete a apresentação de uma proposta para o novo programa de renda mínima até a próxima terça-feira (22), mesma data em que o presidente da Comissão Mista do Orçamento, deputado Elmar Nascimento (DEM-BA), espera que o colegiado seja instalado no parlamento.
O senador tem chamado atenção para os “quase 10 milhões de invisíveis” que foram descobertos durante a pandemia. Ele argumenta que esse contingente, que estava fora de programas sociais e teve suas atividades fortemente impactadas pela crise do novo coronavírus, demandará um olhar especial do governo na saída do auxílio emergencial.
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