No último domingo (5/6), a publicação de um estudo que teve sucesso no tratamento de todos os pacientes participantes com um tipo específico de câncer colorretal chamou a atenção da comunidade científica. Resultados tão bons em um grupo não são comuns em medicina, e muito menos no tratamento de câncer.
O diretor de oncologia da Dasa, Gustavo Fernandes, trabalhou no Memorial Sloan Kettering Cancer Center, nos Estados Unidos, onde foi feita a pesquisa inovadora, e é o segundo autor de um estudo no qual se testava um protocolo de tratamento em pacientes com o mesmo problema, uma mutação específica que atinge cerca de 5% dos diagnosticados com o câncer colorretal.
Essas pessoas têm uma falha nas enzimas de reparo do DNA — por isso, o tumor tem várias mutações genéticas que o fazem responder mal à quimioterapia sozinha, mas bem ao combo quimio e rádio. “Fizemos um estudo em pacientes que fizeram quimio, rádio e cirurgia, e colocamos imunoterapia depois. Todos tiveram resposta”, lembra Fernandes.
Enquanto isso, a pesquisa divulgada no último domingo estava começando a se desenhar. O médico Luiz Diaz, primeiro autor do estudo, queria testar se a imunoterapia logo de cara, sem outras modalidades, funcionaria contra esse tumor.
“Eu e a Andrea (Cercek, uma das autoras do novo estudo) queríamos fazer a imunoterapia, e depois a quimioterapia e a rádio. Mas o Luiz tem uma mentalidade mais disruptiva. Se aprendi algo com ele, foi a não sonhar baixo”, conta o oncologista Gustavo Fernandes.
Ele explica que a maior polêmica era mexer em um tratamento que funciona na maior parte dos casos. O grupo tinha dúvidas se o comitê de ética aprovaria o estudo, e Diaz justificou a pesquisa com a possibilidade de melhorar os efeitos colaterais do tratamento a longo prazo – o método tradicional preserva a vida mas pode deixar sequelas como incontinência urinária, fecal e infertilidade.
Vantagens claras
Fernandes voltou ao Brasil e, em 2019, cinco anos depois, recebeu a notícia que o estudo tinha começado e dois pacientes tiveram resposta completa. O dado divulgado na revista científica The New England Journal of Medicine dá conta de 18 indivíduos tratados, 14 com resposta completa e quatro com resposta parcial (pelo tempo de pesquisa, já que esses pacientes começaram o protocolo depois do primeiro grupo).
O tratamento também deve evitar que esses pacientes tenham câncer em outros órgãos, já que o medicamento “acende” o sistema imunológico e suprime qualquer outro ponto de câncer. “É lindo, é o que a gente quer que aconteça com a oncologia: que o paciente receba um tratamento específico para o caso dele”, afirma.
A droga usada, o dostarlimab, é aprovada em vários países, inclusive no Brasil, para câncer de endométrio. Porém, Fernandes acredita que outros medicamentos da mesma classe dele (bloqueio de PD1) tenham o mesmo efeito, ou seja, os benefícios não devem estar atrelados a apenas um remédio.
Próximos passos
Agora, os próximos passos da pesquisa incluem entender o tempo de duração dos efeitos e se o câncer não vai retornar. Fernandes está otimista: segundo ele, outros tipos de tumor com terapias semelhantes têm sucesso a longo prazo.
Outro ponto importante é o tempo de tratamento. O estudo usou o remédio por seis meses, mas quando ele é usado para câncer de endométrio, a média é de dois anos de tratamento. “É um medicamento caro, estimamos um gasto de R$ 60 mil por mês. Se funcionar com apenas seis meses, é uma economia de um ano e meio”, pontua o médico.
Fernandes diz que o estudo abre portas para o método ser usado em outros tipos de câncer, incluindo o de cólon e de pele melanoma, por exemplo. “É um tratamento de uma terapia só, não invasiva, que faz uma correção do sistema imunológico. Isso vai passar a ser provocado em várias outras doenças”, prevê o oncologista.
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