Após a Operação Lucas 12, deflagrada pelo Ministério Público do Rio de Janeiro (MPRJ) e pela Polícia Civil, prender 5 dos 55 filhos da deputada federal Flordelis e apontar a parlamentar como mandante do assassinato do marido, o pastor Anderson do Carmo, os procuradores revelaram uma série de evidências que ligam a deputada à morte de Anderson, que ocorreu em 16 de junho do ano passado. O pastor foi executado com mais de 30 tiros na porta da casa do casal em Pendotiba, Niterói, Rio de Janeiro. Entre as provas que mostram a ligação de Flordelis ao caso está uma mensagem da deputada a um dos filhos, André: “Fazer o quê? Separar dele não posso, porque senão ia escandalizar o nome de Deus”. Na época do assassinato, Flordelis afirmou que se tratava de um assalto na porta de sua casa. No entanto, não demorou muito para os policiais encontraram divergências nos depoimentos prestados pela pastora e pelos filhos.
Segundo os investigadores, ela tentou assassinar o pastor pelo menos seis vezes por envenenamento, além de contratar pistoleiros em outras duas ocasiões. Flordelis e Anderson eram os fundadores da igreja Ministério Flordelis – Cidade de Fogo e, de acordo com os promotores, a deputada e pastora não estava satisfeita com a forma como Anderson estava conduzindo a igreja e as finanças da família, o que levou ao planejamento do assassinato. Na operação, cinco filhos de Flordelis e Anderson foram presos – ela não – por exercer mandato, a pastora conta com imunidade parlamentar e só poderia ser presa em flagrante de crime inafiançável. O presidente do PSD, Gilberto Kassab, afirmou que a deputada será desfiliada do partido.
Nesta terça-feira, 25, os cinco filhos da pastora foram transferidos para um presídio em Benfica, também no Rio de Janeiro – todos são acusados de participação no assassinato de Anderson do Carmo. A deputada já é ré e será julgada em primeira instância junto aos demais acusados pela 3ª Vara Criminal de Niterói. Sem poder pedir a prisão da deputada, a Polícia Civil e o MPRJ pediram à Justiça outras medidas cautelares, que já foram aceitas. Um dia após a morte de Anderson, a Câmara dos Deputados prestou solidariedade à deputada. “Todo o Parlamento sabe que o casal é exemplo de doação e de misericórdia em pessoa”, disse o deputado Eli Borges (Solidariedade-TO).
‘Organização criminosa’ e tentativas de envenenamento por arsênico
A Polícia Civil descreve a família de Flordelis e Anderson, formada em maior parte por filhos adotivos, como “uma organização criminosa intrafamiliar”, apesar das diversas demonstrações de união entre os membros. “O inquérito traz a desconstrução dessa imagem de decência (da deputada), de pessoa caridosa. Ela vendia esse enredo para conseguir chegar à Câmara dos Deputados, e depois tratar essa pessoa (Anderson) como objeto descartável”, disse o delegado Allan Duarte, titular da Divisão de Homicídios de Niterói, Itaboraí e São Gonçalo. As investigações apontaram ainda que a deputada vinha tentando envenenar o marido com arsênico desde 2018, que era adicionado à comida e às bebidas do pastor “de forma dissimulada”. Anderson chegou a ser hospitalizado com quadros de vômito e diarreia.
Em 2009, a vida de Flordelis foi retratada em filme. ‘Flordelis: Basta Uma Palavra Para Mudar’ contou com elenco de atores globais como Reinaldo Gianechinni, Letícia Sabatella, Cauã Reymond, Deborah Secco e Fernanda Lima, além da própria pastora, que conta passagens da sua vida na favela do Jacarezinho, no Rio de Janeiro, e detalha algumas das adoções e ajudas que diz ter promovido entre as pessoas da comunidade. “Convivendo com a violência numa comunidade carioca, Flordelis se depara com a desesperança das mães dos jovens recrutados pelo crime. A moça encontra na fé evangélica uma forma de resgatá-los da marginalidade”, diz a sinopse.
Os 55 filhos: ‘Primeira geração tinha regalias’
Nas redes sociais, Flordelis postava fotos dos filhos e afirmava não ver distinção entre os adotivos e biológicos. “Sou mãe de 55 filhos e filhas. Quantos são biológicos ou adotivos? Isso pouco importa, porque eu considero todos os meus filhos com o mesmo grau de importância e preocupação”, escreveu em um post no Dia das Mães. O inquérito da Polícia Civil, no entanto, aponta que havia “regalias” para a primeira geração de adotados e para os filhos biológicos, enquanto para os demais, não. Na casa do casal, em Pendotiba, a primeira geração tinha privilégios como quartos individuais e uma geladeira especial – no total, oito eram privilegiados. Os outros 47 filhos ficavam em quartos coletivos e tinham acesso à comida de qualidade inferior, revelou a investigação e os depoimentos. As redes sociais da pastora não são atualizadas desde domingo, 23. A última atualização das redes sociais de Anderson aconteceu em 15 de junho de 2019 – ele foi assassinado no dia seguinte.
Quem são os presos no caso Flordelis
No total, são 11 denunciados no caso Flordelis – dez membros da família e um ex-policial. Um dos filhos adotivos, Lucas Cezar dos Santos, foi preso após o assassinato do pastor, acusado de associação criminosa. Lucas teria facilitado a compra da arma usada no assassinato. O filho biológico, Flávio dos Santos Rodrigues, teve o mandado de prisão expedido na Operação Lucas 12, mas também já se encontrava preso. Ele é acusado como o autor dos disparos. O ex-policial Marcos Siqueira também já estava preso e deve responder por associação criminosa. Na Bíblia, o livro de Lucas, capítulo 12, diz que “nada há encoberto que não haja de ser descoberto; nem oculto, que não haja de ser sabido”. Nesta terça foram presos três filhos adotivos, dois filhos biológicos e uma neta de Flordelis, que estava no apartamento funcional da deputada em Brasília. Todos vão responder por homicídio triplamente qualificado e associação criminosa majorada. Entre os filhos biológicos estão Simone dos Santos Rodrigues, Flávio dos Santos Rodrigues, que está preso desde o começo das investigações, e Adriano dos Santos Rodrigues. Já entre os adotivos estão Marzy Teixeira da Silva, André Luiz de Oliveira, Carlos Ubiraci Francisco da Silva. À Flordelis e Lucas ainda é imputado o crime de uso de documento falso, por tentarem, através de carta redigida pelo filho, atribuir a autoria e ordem para a prática do homicídio a outras pessoas. Segundo a denúncia, Flávio tinha o objetivo de livrar ele próprio e Flordelis da responsabilização do crime.
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