Medicamento conhecido como mais caro do mundo recebe registro da Anvisa


Zolgensma promete neutralizar em crianças pequenas os efeitos da atrofia muscular espinhal (AME) tipo 1, doença rara que pode causar a morte antes dos dois anos. Até 2017, AME não tinha tratamento no Brasil. Anvisa publica registro do medicamento conhecido como o mais caro do mundo
A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) publicou nesta segunda-feira (17) o registro do medicamento Zolgensma, conhecido como o mais caro do mundo, que custa US$ 2,1 milhões (cerca de R$ 11 milhões) por paciente.
De acordo com o registro da Anvisa, o Zolgensma será usado para tratar somente crianças de até 2 anos diagnosticadas com atrofia muscular espinhal (AME) tipo 1, a forma mais grave da doença e que geralmente causa a morte antes dessa idade.
O neurologista pediátrico Rodrigo Reis, membro do corpo clínico da Faculdade de Medicina do ABC, explica que a AME é uma doença neuromuscular degenerativa e progressiva sem tratamento até pouco tempo.
“A AME não é reversiva e progride até atingir a musculatura respiratória do paciente”, diz Reis, afirmando que isso pode mudar com o uso do Zolgensma em bebês.
“O Zolgensma modifica o DNA do paciente e cria uma cópia funcional, isso em uma única dose. Teoricamente, estamos falando em cura da AME tipo 1, apesar de muito provavelmente as crianças ainda precisarem de atenção multidisciplinar, como fisioterapia e fonoaudiologia”, afirma Reis.
O Zolgensma será o segundo medicamento disponível no Brasil para tratar AME, mas é o primeiro tratamento genético da doença, capaz de reparar genes do DNA do paciente.
A controvérsia em torno do remédio mais caro do mundo
O milionário Zolgensma não está disponível no SUS, mas o registro na Anvisa é o primeiro passo para que o governo incorpore o remédio na saúde pública.
O primeiro medicamento para AME no Brasil é o Spinraza, registrado pela Anvisa em 2017 depois de mobilizações de famílias pedindo ajuda do governo para custear o tratamento, em torno de R$3 milhões na época. Desde o ano passado, o medicamento está disponível no SUS. (veja abaixo a diferença entre os medicamentos)
Tratamentos recentes e milionários
Até 2017, não existia medicamentos para tratar quem nascia com a AME no Brasil. “O paciente basicamente recebia terapias multidisciplinares para ter uma melhora da qualidade de vida”, diz Reis.
Este foi o caso do Fernando Lopes Vasconcellos, que nasceu com AME tipo 1 em 1996.
“Eu recebi o diagnóstico mais horroroso do mundo. Perguntei ao médico o que poderíamos fazer pelo meu filho e ele respondeu: ‘nada. Ele vai atrofiar inteiro e vai morrer antes dos dois anos'”, conta Adriane Aparecida Lopes, mãe de Fernando.
Fernando nasceu com AME em uma época que não tinha tratamento para a doença no Brasil. Ele morreu aos 9 anos
Arquivo pessoal
Aos sete meses de vida, após uma parada cardíaca, Fernando foi internado na UTI de um hospital pediátrico de Curitiba.
“Ele ficou internado por 9 anos, até morrer de uma infecção hospitalar. A verdade é que ninguém sabia o que fazer com esses pacientes naquela época”, lembra Adriane. “Eu fui uma mãe de UTI.”
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Em 2001, Adriane reuniu um grupo de pais de crianças com AME e fundou a Associação Brasileira de Atrofia Muscular Espinhal (Abrame). “Criamos a Abrame para compartilhar experiências e informações sobre a AME. Naquela época, ninguém falava da doença, estávamos no escuro”, conta.
“Nós humanizamos a UTI pediátrica. Antes, meu filho estava condenado a viver olhando para uma parede branca e eu só podia vê-lo 15 minutos na parte da manhã e 15 minutos na tarde. Depois de muita briga, o Fernando aprendeu a ler, tinha brinquedos e podia me ver quando quisesse”, conta Adriane.
Fernando nasceu com AME em uma época que não tinha tratamento para a doença no Brasil. Ele morreu aos 9 anos.
Arquivo pessoal
Adriane se diz muito otimista com o registro do Zolgensma pela Anvisa. “Sou a pessoa mais feliz do mundo vendo a chegada desses remédios, saber que agora existe tratamento”, diz.
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Pessoas com AME têm baixos níveis da proteína SMN, que possibilita os movimentos motores. Os neurônios precisam dela para conseguirem enviar ordens para os músculos através dos nervos que descem pela medula.
Tanto o Zolgensma quanto o Spinraza aumentam a produção da proteína SMN, mas somente o Zolgensma é capaz de neutralizar os efeitos da AME.
“Enquanto o Zolgensma muda o DNA do paciente, possibilitando que o corpo produza a proteína SMN a partir daí naturalmente, o Spinraza é um tratamento que faz com que o RNA produza a proteína”, explica Reis.
Outra diferença entre os medicamentos, de acordo com o neurologista pediátrico, é que o uso do Spinraza “é um tratamento para o resto da vida, que precisa de uma nova dose a cada 4 meses”. Já o Zolgensma é administrado apenas uma única vez e não precisa de manutenção.
Apesar de ser um medicamento novo, “Estudos demonstraram que os pacientes que receberam o Zolgensma tiveram grandes avanços nos marcos iniciais do desenvolvimento neurológico”, completa o neurologista pediátrico.

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