Imagine que você tenha que dizer qual número está mais associado ao total de casos de covid-19 nos municípios brasileiros. A resposta é o número 1. Em 1.557 localidades o número de casos está na casa dos dez, dos cem, mil, dez mil ou mesmo cem mil. O 1 é o primeiro número do total de contaminações em 28% dos municípios. O segundo número mais recorrente é o 2. Está associado a 960 municípios. Ou 17%. Em terceiro, o 3, com 756 locais. Já o quarto colocado é o 4, com 579. E por aí vai até o nove, não à toa o nono número mais recorrente. Mais do que curiosidade, esses números são um exemplo da Lei de Benford, uma teoria estatística que vem sendo usada numa série de campos do conhecimento na atualidade. A ideia surgiu no fim do século 19. Antes das calculadoras, eram usadas as tabelas de multiplicação. Um astrônomo, Simon Newcomb, examinando um livro com estes logaritmos, notou que as primeiras páginas eram mais gastas do que as últimas. Achou que era coincidência,mas, examinando outros livros, percebeu a mesma coisa. Só que não é ele, mas um engenheiro, Frank Benford, que batiza a teoria. Décadas depois, Benford notou que para mais de 20 contextos, seja a extensão dos rios, o tamanho da população ou a mortalidade, o padrão se repete. A grosso modo, a teoria diz que a chance do primeiro dígito de um número ser 1 é a mais alta. A segunda maior chance é de ser 2. Depois, 3. E vai diminuindo até o 9.
Segundo a série “A Era dos Dados”, que estreou recentemente na Netflix, a Lei de Benford seria usada pelos governos para descobrir os contribuintes que estão sonegando impostos. Também serviria para detectar tentativas de fraude das eleições. Ou centenas de milhares de perfis falsos que disseminam fake news nas redes sociais. Com a covid-19, a Lei de Benford tem sido aplicada para confirmar os dados da China. Muita gente desconfia dos números chineses de casos. Mas um estudo de pesquisadores da Universidade de Oxford, no Reino Unido, e do Federal Reserve, banco central dos Estados Unidos, aplicando a teoria, mostrou que a epidemia se comportou no país como na Itália e em território americano e o resultado pode desapontar os teóricos da conspiração.
*Samy Dana é economista e comentarista da Jovem Pan.
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