Putin anuncia que Rússia é o 1º país a registrar vacina contra o novo coronavírus; não foram publicados estudos sobre testes

Comunidade internacional coloca vacina sob suspeita. Em página da OMS, vacina russa consta na fase 1 de testes, sem completar a segunda e a terceira etapa. Próxima fase de testes deve ocorrer no Brasil, além de outros países, segundo site russo. Putin anuncia vacina e diz que uma das filhas participou de testes: Funciona efetivamente
O presidente russo, Vladimir Putin, anunciou nesta terça-feira (11) que a Rússia é o primeiro país do mundo a registrar uma vacina contra o novo coronavírus. Apesar do anúncio, sabe-se pouco sobre a eficácia dessa vacina, e ela vem sendo questionada por especialistas internacionais.
A Rússia também anunciou que o Brasil deve participar da próxima fase dos testes da imunização, prevista para começar na quarta-feira (12). (Veja detalhes mais abaixo nesta reportagem).
“Esta manhã uma vacina contra o novo coronavírus foi registrada pela primeira vez no mundo”, disse o chefe do Kremlin em reunião com o Gabinete de Ministros.
Segundo a atualização mais recente da Organização Mundial de Saúde (OMS), do dia 10 de agosto, sobre as vacinas contra a Covid-19 em desenvolvimento no mundo, a vacina russa ainda estava na fase 1 dos testes. O desenvolvimento de uma vacina prevê 3 etapas.
Nesta terça (11), a OMS comentou o anúncio da vacina russa. A entidade declarou que a Rússia “não precisa de sua aprovação” para registrar a vacina, e que precisará ter acesso aos dados da pesquisa para avaliar a eficácia e segurança da imunização para aprová-la.
Ao todo, 165 vacinas contra a Covid-19 estão sendo pesquisadas em todo o mundo, segundo os dados da organização. Seis dessas candidatas estão na fase final de testes em humanos (a fase 3).
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A imunização russa se chamará Sputnik V, em alusão à corrida espacial da Guerra Fria entre União Soviética e Estados Unidos. O Sputnik I foi o primeiro satélite a orbitar a Terra, lançado pelos soviéticos em 1957.
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Parceria com o Brasil
Nesta terça (11), o governo do Paraná anunciou que vai assinar, na quarta (12), um acordo para fabricar a imunização russa. A produção, entretanto, não tem previsão de início, pois depende de aprovação da Anvisa.
No dia 24 de julho, o governo do estado já havia anunciado que estudava uma parceria com a Rússia para fabricação da vacina.
Questionada pelo G1 sobre a produção da imunização, a Fiocruz respondeu que “o acordo com o instituto russo para a produção da vacina será feito com o Instituto de Tecnologia do Paraná (Tecpar), conforme pronunciamento do diretor do instituto nesta manhã”.
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A Fiocruz tem um acordo de parceria com a farmacêutica AstraZeneca, no Reino Unido, para transferência de tecnologia, para o Brasil, da produção da vacina testada pela Universidade de Oxford.
Segundo o site da nova vacina, o Brasil irá participar da fase 3 dos estudos clínicos, que tem previsão para começar na quarta-feira (12). Serão 2 mil participantes; além dos brasileiros, deve haver voluntários da própria Rússia, dos Emirados Árabes, da Arábia Saudita e do México.
O G1 questionou o Ministério da Saúde sobre a participação brasileira nos testes. Por meio da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), o governo afirmou que não há solicitação de qualquer entidade ou parceiro a respeito dessa vacina no país.
Segundo a Anvisa para realizar um ensaio clínico no Brasil é preciso da aprovação do Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (Conep), órgão vinculado ao Ministério da Saúde.
A produção em massa da vacina em território russo tem previsão para começar em setembro.
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A imunização foi desenvolvida pelo Centro Nacional de Investigação de Epidemiologia e Microbiologia Gamaleya junto ao Ministério da Defesa.
Segundo o site da vacina, ela foi testada em animais antes de ser aplicada em humanos – incluindo em dois tipos de primatas. A Rússia não publicou, entretanto, nenhum estudo científico sobre os testes que realizou.
Os testes em humanos começaram em 18 de junho, quando o primeiro grupo, de 18 voluntários, recebeu a imunização em sua forma liofilizada (a liofilização é uma espécie de “desidratação da vacina”, que estabiliza a molécula). Cinco dias depois, no dia 23, mais 20 pessoas receberam a dose, também deste tipo.
Segundo os detalhes disponíveis on-line sobre os testes com a vacina (na versão liofilizada e líquida), os primeiros 18 voluntários da forma liofilizada foram divididos em dois grupos de 9 pessoas. Cada um dos grupos recebeu uma única dose da vacina; a diferença entre eles era o adenovírus que servia de “transporte” para a proteína do novo coronavírus (veja explicação mais abaixo). Essa etapa correspondeu à fase 1 dos experimentos.
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A fase 2 foi a dos 20 voluntários, que começou os testes no dia 23 de junho. Essas pessoas receberam, além da primeira dose, um reforço, previsto para 21 dias após a primeira dose. Diferentemente dos 18 primeiros, todos os 20 voluntários da fase 2 receberam ambas as vacinas (cada uma com um tipo de adenovírus).
Em julho, a Rússia anunciou que a vacina induziu a produção de anticorpos na primeira fase de testes. No mesmo mês, a Universidade Sechenov, em Moscou, informou que outra versão da mesma vacina, em forma líquida, estava sendo testada em outros 38 voluntários em um hospital militar da capital russa. Os voluntários foram divididos da mesma forma que os da vacina liofilizada.
Os testes de fase 1 e 2 foram completados no dia 1º de agosto, segundo o site oficial da vacina.
“Nenhum participante dos atuais ensaios clínicos foi infectado com Covid-19 após ter a vacina administrada”, diz o site.
“A alta eficácia da vacina foi confirmada por testes de alta precisão para anticorpos no soro sanguíneo de voluntários (incluindo uma análise para anticorpos que neutralizam o coronavírus), bem como a capacidade das células imunes dos voluntários se ativarem em resposta à proteína S do coronavírus, que indica a formação de anticorpos e resposta imune celular”, afirma o texto.
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Felix Ershov, membro da Academia Russa de Ciências, afirmou que a vacina é segura e eficaz.
“A segurança da vacina é garantida, pois utiliza um vírus do resfriado inofensivo para o homem e não contém o coronavírus propriamente dito, estando presente apenas uma parte de seu código genético, afastando assim a possibilidade de infecção”, declarou.
“Mas está garantida a produção dos anticorpos necessários à proteção do organismo, o que é demonstrado não só nos resultados dos testes, mas também na utilização de outras vacinas deste tipo”, acrescentou Ershov.
“Esta vacina não é integral como acontecia com as vacinas anteriores (vírus vivo ou inativado). Ela foi projetada com biotecnologia avançada”, completou.
O vice-diretor de Anestesiologia e Reanimação do Hospital nº 52 de Moscou, Sergey Tsarenko, comparou o mecanismo de funcionamento da vacina ao lançamento de uma nave espacial.
“Uma estação orbital, um filamento do coronavírus, é ligada ao adenovírus, inofensivo para os humanos, [que funciona] como um veículo de lançamento, e também pode ser lançado dentro do corpo humano”, disse.
“Depois disso, a imunidade é desenvolvida tanto para o ‘veículo lançador’ quanto para a ‘estação orbital’. Em seguida, três semanas depois, a mesma ‘estação orbital’ é lançada em outro ‘veículo de lançamento’, isto é, um adenovírus diferente”, explicou Tsarenko.
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“Várias outras vacinas vetoriais estão sendo criadas em todo o mundo, mas até agora ninguém considerou a possibilidade de usar dois ‘veículos de lançamento’ para atingir esse objetivo. Além disso, os primeiros testadores foram funcionários do Instituto Gamaleya”, acrescentou.
“Em seguida, a vacina foi testada em outros voluntários. Não houve uma única complicação e todos os participantes exibiram uma poderosa resposta imunológica”, disse Tsarenko.
O presidente russo, Vladimir Putin, disse que a vacina russa é “eficaz”, passou em todos os testes necessários e permite obter uma “imunidade estável” contra a Covid-19.
As agências internacionais informam ainda que o presidente russo afirmou que uma de suas filhas já tomou a vacina. Suas filhas são Maria, de 35 anos, e Ekaterina, 34, mas não há informação sobre qual delas tomou a vacina.
OMS reforçou importância das 3 fases
Na segunda-feira (10), a OMS alertou que, apesar de haver várias vacinas na fase final de testes, a eficácia delas ainda precisa ser demonstrada, e que, provavelmente, não haverá uma “solução imediata”.
“Várias vacinas se encontram agora em ensaios clínicos de fase três, e todos esperamos ter várias eficazes que possam ajudar a prevenir a infecção nas pessoas. No entanto, não há uma solução imediata neste momento e pode ser que nunca haja”, disse o diretor da OMS, Tedros Adhanom Ghebreyesus.
Vacinação na Rússia
Segundo o Ministério da Saúde da Rússia, após o registro e a produção, a vacinação deve começar em outubro de forma gratuita. Inicialmente, de acordo com as autoridades sanitárias, serão vacinados grupos especiais da população: médicos, professores e aqueles que estão constantemente em contato com grandes grupos de pessoas.
Nesta segunda-feira (10), em entrevista à Itar-Tass, o ministro da Indústria e Comércio, Denis Manturov, indicou que no próximo mês três empresas russas vão começar a produção comercial.
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